09 de maio de 2020

4 Comentários

Mães (reais) da ficção

Quatro diferentes mães que encontramos nos livros

Existe uma frase que nunca entendi muito bem: “mãe só tem uma”. Porque cada um de nós tem uma única mãe biológica, mas pode haver pessoas que tenham mais de uma mãe. Há ainda mães diversas pelo mundo afora, mães de todas as cores, de todos os jeitos, de todas as idades.

Também não me agrada a comparação das mães com super-heroínas. As mães erram, sofrem, amam e são, da mesma forma, capazes de odiar ou de não sentir amor; têm necessidades, desejos e sonhos além da maternidade; podem não estar preparadas para ser mães; e nem sempre serão hábeis em resolver os problemas dos filhos. Em resumo, as mães são apenas mulheres.

Como a ficção imita a vida real, não há melhor lugar para percebermos essas diferentes maternidades do que em uma boa história. Por essa razão, falo aqui de quatro mães que foram criadas por quatro diferentes escritoras, embora possam se parecer com mães reais.

1. Clara

Clara é a matriarca da família Del Valle Trueba, de A casa dos espíritos (Isabel Allende, 2019), que vive em um país latino-americano não explicitado. É uma mulher peculiar, que, desde pequena, mantém contato com espíritos e prevê acontecimentos do futuro — o que não provoca qualquer repulsa nas pessoas ao redor. Pelo contrário, ela vive com a casa cheia de gente e é adorada pelo esposo, pela cunhada e pelos empregados.

No papel de mãe, é possível que Clara seja julgada como relapsa e permissiva, mas é somente desligada e deixa os filhos livres. Mesmo assim, é capaz de desvendar os sentimentos deles e de apoiá-los quando precisam.

De certa forma, mesmo que viva mais tempo em outro mundo, Clara é o alicerce da família, desempenhando a difícil tarefa de manter pai e filhos juntos, apesar das discordâncias e brigas.

2. Hattie

Hattie, de As doze tribos de Hattie (Ayana Mathis, 2014), vive na Filadélfia, nos Estados Unidos, e é mãe de onze filhos e avó de uma neta. Ela se casou com um homem que só lhe trouxe aborrecimento e passou a viver uma vida com a qual não sonhava.

Hattie não é do tipo que conversa, brinca e se diverte com os filhos. Também não demonstra afeto. Seu principal cuidado é alimentá-los, mantê-los vivos. Isso faz com que os filhos, mesmo depois de adultos, pensem que a mãe não os ama.

Hattie é prática e mostra seu amor de um jeito não convencional — a única forma que aprendeu. Além disso, a experiência que viveu no início de sua maternidade (a morte dos seus primogênitos) pode tê-la tornado mais dura e mais preocupada com a sobrevivência.

3. Ifeoma

Ifeoma, de Hibisco roxo (Chimamanda Ngozi Adichie, 2011), é professora universitária e viúva e vive com seus três filhos em um apartamento no campus universitário, em Nsukka, na Nigéria.

Sua relação com os filhos é de confiança e abertura. Por isso, mesmo com pouca idade, os filhos se sentem seguros para falar o que pensam e questionar aquilo que não entendem ou com que não concordam. E isso é tão forte que, em certo momento, Ifeoma se pergunta se fez bem em dar tanta liberdade a eles.

Essa forma de educar os filhos é percebida com surpresa pela sobrinha Kambili, a narradora e protagonista da história. Por sua vivência com os próprios pais, a menina não consegue compreender de início o jeito franco que a família de Ifeoma tem de conversar e dar risadas.

4. Natalina

Natalina, de Quantos filhos Natalina teve? (Olhos d’água, de Conceição Evaristo, 2016), vive na periferia de uma grande cidade, no Brasil, e descobre sua quarta gravidez após sofrer violência sexual.

Nas três primeiras gestações, Natalina sentiu enjoo, medo, vergonha, ódio e vontade alguma de ser mãe. Engravidou por descuido ou inexperiência, por desejo de outras pessoas. Por isso, entregou os três bebês que dali nasceram aos cuidados de terceiros.

A quarta gravidez Natalina também não planejou, sequer concordou com o ato que a originou. Mesmo assim, embora a experiência dolorosa pudesse tê-la feito rejeitar o filho, agora ela se sente mãe de verdade pela primeira vez. Isso porque Natalina sabe que a criança é toda sua e não a obrigará a se unir a outro alguém. Além disso, esse filho a faz recordar o dia em que se livrou da morte.

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4 Comentários

  • Eliete Morais
    12 maio, 2020

    Adorei! Lindo de se ver, ainda bem que tem várias maneiras de ser mãe, Ufa! Pois todos os tento ser uma mãe melhor e continuo falhando. 😁

    • Eriane Dantas
      15 maio, 2020

      Até parece, né?

  • Ana Luiza
    10 maio, 2020

    Muito bom! Amei!
    Cada vez mais temos aprendido que tem vários jeitos de ser.mãe . Assim como temos reconhecido que uma mulher não precisa ser mãe para se sentir uma “mulher completa” (se é que isso existe né?).

    • Eriane Dantas
      12 maio, 2020

      Obrigada, Ana!
      Ainda bem que estamos avançando (pelo menos um pouquinho) nesse pensamento, né?

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