12 de julho de 2022

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[Resenha] O terraço e a caverna

Por Maurício Limeira

  • Título Original: O terraço e a caverna
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: FCP
  • Ano de Publicação: 2016
  • Número de Páginas: 274
Sinopse: Quinha tem onze anos. Mora com os pais, o irmão e o avô numa cobertura na zona sul do Rio de Janeiro.

Paco tem doze. Mora com o pai, os tios e a avó, num buraco abandonado do metrô carioca depois que o tráfico os expulsou da comunidade em que viviam.

Ele é cadeirante. Ela sofre da Síndrome das Pessoas Inexistentes, vivendo solitária num universo muito particular, onde gatos falam, voam e são terrivelmente ardilosos.

As probabilidades de Quinha e Paco se conhecerem são mínimas.

Mas isto não é empecilho para o destino.
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Duas crianças da mesma faixa etária experimentam realidades opostas na cidade do Rio de Janeiro. Uma vive no terraço e a outra, na caverna e, por motivos diferentes, ambas se afastaram do convívio social. Podem então seus caminhos se cruzar?

Esse é o mote de O terraço e a caverna, segundo romance do escritor carioca Maurício Limeira, um dos vencedores do Prêmio Literário Dalcídio Jurandir 2015, da Fundação Cultural do Estado do Pará (FCP).

De classe alta, Quinha reside numa cobertura em um bairro nobre da capital fluminense. Apesar de dividir o espaço com os pais, o avô e o irmão e receber cuidados desses entes dedicados, ela não sente a presença da família, não sabe sequer que ela existe. A Síndrome das Pessoas Inexistentes, que se desenvolveu depois de um episódio traumático, cria na menina a impressão de ser a última humana na Terra. Por isso, seu único relacionamento é com um gato chamado Moisés, que aparece e desaparece à medida que seu estado de saúde fica mais ou menos crítico.

Já a residência de Paco é um buraco onde seria construído parte do metrô. Foi esse o lugar em que ele e sua família (pai, tios, primos e avó) se abrigaram quando traficantes de drogas os expulsaram de casa. Cadeirante, o menino sofre preconceito na escola e abandona os estudos. Com um computador recebido em doação e com energia elétrica e internet instaladas de forma clandestina, Paco se aproxima do mundo externo e expressa sua indignação com a vida nas redes sociais.

São essas plataformas que proporcionam o encontro entre Paco e Quinha. A menina supõe que Paco é personagem de uma história, como todos os seres humanos que acompanha na internet. Paco também imagina mil coisas sobre a amiga virtual.

Não é novidade que as redes sociais facilitam o contato entre pessoas distantes e diversas, mas nem sempre promovem a comunicação e a convivência. Nesse ambiente, mostra-se apenas um ângulo da vida real (em geral, a mais positiva ou aquela que pode causar polêmica e viralizar, como se diz). Não raras vezes, esconde-se a realidade, fingindo-se ser outro alguém, simulando-se sentimentos e situações. Quinha então não se equivoca ao imaginar personagens de ficção por trás dos perfis.

Volta e meia, eu me sinto como ela nesse meio: “sigo” pessoas que jamais conheceria na vida real, com as quais não interajo, que, em certos casos, chego a duvidar que existam de verdade. Quase toda semana, questiono a minha permanência nesse espaço, tendo em vista as emoções que provoca em mim.

A reflexão no livro sobre a existência dos seres humanos, porém, não se resume ao meio virtual. A mente de Quinha escolheu apagá-los porque considerou mais conveniente viver sozinha — o que é compreensível. Somos cruéis, gananciosos e egoístas; temos, na mesma medida, a capacidade de construir coisas belas e de destruir tudo o que tocamos. O mundo certamente seria mais bonito sem a nossa presença.

Por outro lado, ninguém sobrevive sem companhia. Precisamos de nossos pares para nos desenvolver, aprender. No caso de Quinha, embora não reconheça, as pessoas a mantêm viva, sejam os pais e o avô ocupando-se de seu bem-estar, sejam os personagens da internet distraindo-a com suas histórias. No caso de Paco, seus familiares, mesmo de uma forma torta, são seu esteio, sua referência, e qualquer pontinha de afeto reaviva as esperanças do menino.

O terraço e a caverna foi uma surpresa positiva. Não conhecia a obra ou o autor. Ganhei um exemplar do próprio Maurício Limeira, depois de um e-mail que me perguntava se eu me interessaria em ler o livro.

Demorei a ler, demorei meses. Passei por uma fase de pouca leitura, por desânimo, por Covid, por um período de atenção às benditas redes sociais — nem sempre perdendo tempo; também divulgando os meus livros: o meu caçula e o que está para chegar (mas isso fica para a próxima postagem).

Bem escrito, O terraço e a caverna é denso, coerente e convincente (talvez haja até exagero na explicação da condição de Quinha). Quanto mais avançava na história, mais eu me envolvia com os personagens principais e suas dores. Cenas em que Quinha conversa com o gato Moisés me arrepiaram. São angustiantes também o sofrimento dos pais e do avô da menina, suas tentativas de aproximação, suas expectativas a cada menor sinal de melhora. Do mesmo modo, cortam o coração a revolta de Paco e sua busca pelo carinho do pai.

Tenho ressalvas apenas quanto aos capítulos derradeiros. Não só porque eu desejei outro desfecho, mas também porque o ritmo e a forma de construção das páginas finais destoaram daqueles do restante da obra (causando-me a sensação de que o autor, depois de 23 capítulos, quis encerrá-la rapidamente nas duas últimas seções). Nada disso, porém, diminuiu o valor do texto ou o seu impacto em mim (e o valor de um texto literário se encontra exatamente na repercussão em quem o lê).

***

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