04 de abril de 2023

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[Resenha] O último dia de um condenado

Por Victor Hugo

  • Título Original: Le dernier jour d'un condamné
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: Estação Liberdade
  • Ano de Publicação: 2010
  • Número de Páginas: 198
Sinopse: Em um romance de surpreendente modernidade, o grande escritor do romantismo se joga de corpo e alma contra a pena de morte. Composta de um texto principal – o diário dos últimos dias da vida de um condenado –, de uma peça na qual personagens inventados por Victor Hugo criticam ferozmente a obra (prefácio à edição de 1829) e de um longo panfleto em defesa da causa (prefácio de 1932), esta edição vem contribuir para um debate em torno de uma discussão que alguns ainda tentam reviver no Brasil. Redigida em primeira pessoa, sentimos como um soco no estômago a voz de alguém que compartilha nossa existência por um tempo determinado. Logo sua cabeça será ceifada pela famosa engenhoca do doutor Guillotin e irá rolar para o cesto que as apara após a decapitação. Num ambiente de trevas, assistimos na própria descrição do condenado hora a hora aos preparativos de sua morte, à sorte de seus companheiros mais felizardos dos trabalhos forçados, à derradeira visita de sua filha que não o reconhece e o afasta ("o senhor me machuca com essa barba"), ao despojamento de seus últimos pertences para companheiros de "fortuna", etc. A obra foi escrita em menos de três meses sob influência de uma execução em Paris à qual Victor Hugo assistiu em 1825.
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O último dia de um condenado vivia ali há anos, esperando que eu o tirasse da estante para alguma coisa mais que limpar e reorganizar o acervo. Eu o comprei em uma promoção, sem qualquer indicação ou pista de seu conteúdo, apenas pelo nome do autor, que também é responsável por O corcunda de Notre Dame (1831) e Os miseráveis (1862).

Esses dois títulos eu não li ainda, mas já vi filmes baseados em suas histórias. Conheço o autor francês pelos versos que inspiraram a canção do Frejat que era um dos hinos da minha adolescência.

Subestimei O último dia de um condenado. Por isso, passei à sua frente tantos outros livros – até aquisições bem recentes. Mas o último carnaval serviu para o nosso encontro. E que encontro!

Nessa obra, acompanhamos a narração dos últimos dias (não só um) – as últimas seis semanas, para ser exata – de um homem condenado à morte na guilhotina em Paris, no século XIX.

Vivemos junto dele a escalada de sentimentos: a espera por uma graça ou um milagre, que não virão, e sua resignação, que volta a ser desespero. Ele narra as lembranças, os pensamentos sobre a situação da mãe, da esposa e da filha (especialmente desta última) após a sua morte. E a presença da gente que assoma de toda parte para assistir ao momento em que a lâmina separará sua cabeça do seu corpo.

Essa, para mim, é a pior parte: o interesse das pessoas pela desgraça do outro, a insensibilidade diante da tragédia alheia.

Toda a discussão também me fez lembrar que o tema pena de morte não se encerrou, mesmo que tenhamos uma legislação avançada em termos de direitos humanos. Vira e mexe esse assunto volta à tona, assim como a maioridade penal, e se torna tópico de debates nas caixas de comentários das redes sociais. Os especialistas em nada logo saem com respostas a problemas complexos. Afinal, é fácil culpar apenas os indivíduos e gritar por punições severas.

Isso me levou a pensar que o livro não se distancia tanto assim da realidade atual, em que a barbárie atrai a atenção e gera engajamento. Eu não me surpreenderia se um evento como aquele juntasse, ainda hoje, centenas de pessoas em praça pública, que defenderiam, furiosas, a execução do condenado.

É engraçado que, já em 1832, Victor Hugo entendia a complexidade do problema social que empurra os indivíduos para o crime. Naquela época, como se vê no prefácio do livro, o autor afirmou que a pena de morte não cabia aos homens e que nem mesmo servia de exemplo, ao contrário do que se sustentava, dada a criminalidade crescente.

Já naquele tempo, ele compreendia que a prática só tornava o povo duro e insensível, embora fosse o mais atingido por essa pena. Já naquele tempo, percebia a necessidade de “tratar” o criminoso e não de o expurgar da sociedade.

O último dia de um condenado, confessa Victor Hugo, é uma defesa aberta do fim da pena de morte, o seu modo de tentar “frear o derramamento de sangue”.

Enquanto lia a respeito daquela plateia animada para ver o espetáculo da morte de outro alguém, refletia: o ser humano, em geral, não é somente impiedoso; é também incoerente. Ao comemorar o sofrimento do outro, como vingança pelo erro cometido, não cogita que, no dia seguinte, a sua cabeça pode estar em risco também. É isso, inclusive, o que diz o condenado.

E que angustiante deve ser conhecer a data da própria morte, ainda mais uma tão dolorosa, tão humilhante. Senti cada sensação narrada pelo condenado diante de um destino que sabia sem volta, sem mudança de rota.

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