23 de novembro de 2019

13 Comentários

[Resenha] A bolsa amarela

Por Lygia Bojunga

  • Título Original: A bolsa amarela
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: Casa Lygia Bojunga
  • Ano de Publicação: 2019
  • Número de Páginas: 140
Sinopse: A bolsa amarela é o romance de uma menina que entra em conflito consigo mesma e com a família ao reprimir três grandes vontades (que ela esconde numa bolsa amarela) — a vontade de crescer, a de ser garoto e a de se tornar escritora. A partir dessa revelação — por si mesma uma contestação à estrutura familiar tradicional em cujo meio "criança não tem vontade" — essa menina sensível e imaginativa nos conta o seu dia-a-dia, juntando o mundo real da família ao mundo criado por sua imaginação fértil e povoado de amigos secretos e fantasias. Ao mesmo tempo que se sucedem episódios reais e fantásticos, uma aventura espiritual se processa e a menina segue rumo à sua afirmação como pessoa.
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A bolsa amarela é um livro para crianças e jovens publicado pela primeira vez em 1976. Mesmo assim, apesar de seus 43 anos, podemos dizer que suas reflexões continuam válidas e atuais.

Faz tempo que eu tenho vontade de ser grande e de ser homem. Mas foi só no mês passado que a vontade de escrever deu pra crescer também (p. 10).

Terceiro livro de Lygia Bojunga, A bolsa amarela está em sua 36ª edição. Foi traduzido para diversos idiomas, foi encenado no Brasil, na Bélgica e na Suécia, recebeu o prêmio O melhor para a criança, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) e outros prêmios internacionais.

A autora escreveu mais 22 livros, entre eles O sofá estampado (1980), Feito à mão (1996) e Intramuros (2016), e publica suas obras por meio de uma editora própria, a Casa Lygia Bojunga.

A bolsa amarela conta a história de Raquel, uma menina que se sente meio deslocada na família, que não a escuta ou compreende, como ela mesma relata em uma carta a um amigo inventado:

Quando eu nasci, minhas duas irmãs e meu irmão já tinham mais de dez anos. Fico achando que é por isso que ninguém aqui em casa tem paciência comigo: todo mundo já é grande há muito tempo, menos eu. Não sei quantas vezes ouvi minhas irmãs dizendo: ‘A Raquel nasceu de araque. A Raquel nasceu fora de hora. A Raquel nasceu quando a mamãe não tinha mais condição de ter filho.’. Tô sobrando, André. Já nasci sobrando. É ou não é? […] (p. 11).

Percebendo que criança tem pouca ou nenhuma escolha e que, da mesma forma, as mulheres são impedidas de fazer uma porção de coisas, Raquel tem vontade de ser grande e de ser menino. Ela tem também uma terceira vontade: ser escritora.

Mas, como sua família não é muito aberta às suas vontades e até ri de suas invenções, ela decide esconder as três vontades, para que ninguém as veja. O melhor lugar que encontra é uma bolsa amarela que chega entre os presentes de uma tia e que ninguém da família quer.

Eu tenho que achar um lugar pra esconder minhas vontades. Não digo vontade magra, pequenininha, que nem tomar sorvete a toda hora, dar sumiço da aula de matemática, comprar um sapato novo que eu não aguento mais o meu. Vontade assim todo mundo pode ver, não tô ligando a mínima. Mas as outras — as três que de repente vão crescendo e engordando toda a vida —, ah, essas eu não quero mais mostrar. De jeito nenhum (p. 9).

Na bolsa amarela, ela guarda também outras coisas e amigos secretos, com os quais entra em um mundo de fantasia que a ajuda a lidar com as limitações de menina e com o crescimento daquelas vontades.

O livro cutuca a sociedade daquela época sobre a forma como as crianças em geral são tratadas: sem direito a se expressar, tendo sua privacidade invadida a todo momento, sendo obrigadas a fazer coisas que não querem (e que nem são necessárias), como, por exemplo, comer bacalhau na casa da tia, mesmo não gostando de bacalhau, ou fazer apresentações para entreter os adultos.

— Raquel, canta pro tio Júlio e pra tia Brunilda aquele versinho inglês que você aprendeu na escola. É tão bonitinho (p. 70).

Também chama a atenção para as diferenças na educação entre meninas e meninos, na forma como a sociedade podava as mulheres.

— Tá vendo? Falaram que tanta coisa era coisa só pra garoto, que eu acabei até pensando que o jeito era nascer garoto. […] (p. 126).

Então veio o choque quando constatei que um livro com mais de quatro décadas poderia muito bem se passar por um livro escrito agora, a não ser pelo uso de expressões que entregam sua idade.

Hoje em dia, mesmo que o tratamento destinado às crianças seja diferente e que as mães e os pais se esforcem para prover tudo aos filhos (especialmente em termos materiais), é provável que muitas crianças se sintam como Raquel: incompreendidas, sem direito a ter vontades, silenciadas.

Sobre as mulheres, é sabido que, embora tenhamos alcançado muitos direitos, ainda precisamos vencer grandes obstáculos. Ou não continuamos a escutar por aí que tal coisa é de menino e tal coisa é de menina?

Fora essas reflexões, que são bastante ricas, é uma aventura acompanhar as fantasias e o crescimento de Raquel. Por essa razão, recomendo A bolsa amarela não apenas aos jovens leitores e leitoras, mas a todo mundo que aprecia uma boa leitura.

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13 Comentários

  • Igor
    10 junho, 2023

    Estou fazendo uma resenha sobre ele, adorei o livro, me lembrou o “Homem que pescou a Lua”, um livro que nunca vou esquecer, li por diversas vezes entre o quarto ou quinto ano, sensacional, parabéns.

  • Laura
    08 outubro, 2021

    Li esse livro pela primeira vez nos meus tempos de escola, muito provavelmente por volta dos 9/10 anos, na 4º ou 5º série, quando eu costumava correr para a biblioteca assim que tocava o sinal do recreio. E que saudades eu sinto dessa época, de encher aquela ficha com livros, de passar boa parte do meu recreio ali, tateando diversos livros naquelas prateleiras buscando pelo próximo que me fisgasse a atenção. Já faz mais de uma década mas ainda me lembro de esse livro ter sido uma das minhas leituras favoritas, não é a toa que ainda me recordo perfeitamente do quanto fiquei fascinada com a história, e que quase com certeza o peguei emprestado da biblioteca mais de uma vez rs. Infelizmente com o passar dos anos e o avançar desenfreado da tecnologia acabei me tornando uma refém das telas e abandonando esse hábito da leitura, mas ultimamente ando com uma vontade enorme de retomá-lo e por que não com esse clássico que marcou minha infância?
    Ótima resenha, por sinal, que nostalgia em ler esse pequenos trechinhos da história! ♥

    • Eriane Dantas
      04 novembro, 2021

      Que lindas lembranças, Laura! Que você retome o hábito da leitura. Também acho que esse livro é uma ótima opção para recomeçar, já que ele traz tantas recordações pra você.
      Obrigada pela visita! 🙂

  • rayane
    17 agosto, 2021

    super que amei que bom que eu achaei eu vou te que fazer uma redacao amanha

  • leticia
    09 novembro, 2020

    manda um resumo

  • Eduardo
    11 setembro, 2020

    Eu nuca li o livro, Bolsa Amarela.

    • Eriane Dantas
      14 setembro, 2020

      Oi, Eduardo!
      O livro é muito bom. Vai por mim. Vale a pena ler.

  • Eriane Dantas
    03 dezembro, 2019

    Ana,
    Você não vai acreditar (ou vai) se eu disser que ela foi acusada (em 2019).
    Depois que publiquei a resenha, encontrei um texto que falava sobre a tentativa de censura ao livro por um vereador de uma cidade de São Paulo (veja aqui: http://contaumahistoria.com.br/2019/08/a-absurda-censura-a-lygia-bojunga-nunes-e-sua-bolsa-amarela/ e aqui: http://limeira.sp.leg.br/imprensa/noticia.php?id=10337).
    Está na cara que o vereador leu apenas a sinopse e logo se julgou preparado para opinar sobre o conteúdo do livro (como tem sido costume hoje em dia).

  • Ana Luiza
    03 dezembro, 2019

    Sobre a vontade de Raquel de ter nascido homem: se Lygia Bojunga publicasse “A Bolsa Amarela” hoje, seria acusada de defensora da “ideologia de gênero”!

    • Paula
      09 julho, 2020

      Pior que é. Leem e não entendem nada. Seria ate legal se o livro falasse de gênero mas nem é esse o foco. Eu acabei de ler esse livro agora e estou chorando. Já tenho quase 40 anos e me senti tão tocada com essa história tão singela, tão delicada. Que livro lindo.

      • Eriane Dantas
        14 julho, 2020

        É verdade, Paula.
        Raquel tem vontade de ser menino porque sabe que existem coisas que são socialmente proibidas às meninas (e ainda mais na época em que o livro foi escrito). Isso acaba até sendo uma discussão sobre os papéis de gênero, mas não do jeito que as pessoas podem imaginar se não lerem ou se não entenderem a obra. E, se fosse, que problema haveria nisso, né?
        Essa é uma história realmente bela.

        • jamdil
          28 novembro, 2023

          acho um grande absurdo ficar dialogando essa palavra genero. chega dessa ideologia! livros devem focar em ensinar valores e nao subverter valores e confundir a mente das crianca! falta de responsablidadade total levar essa ideologia para criancas!

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