27 de julho de 2018

2 Comentários

[Resenha] Anjo de rua

Por Manoel Constantino

  • Título Original: Anjo de rua
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: Cepe
  • Ano de Publicação: 2011
  • Número de Páginas: 40
Sinopse: Primeiro colocado da categoria Juvenil no I Concurso Cepe de Literatura Infantil e Juvenil. Inspirado na história real de um menino que viveu nas ruas do Recife, mostra como uma amizade pode perdurar, mesmo na adversidade. Ilustrações de Roberto Ploeg.
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Nesses meses, eu achava que amava meu pai, achava minha mãe forte e bonita e os meus irmãos super-heróis.

Hoje trago mais um livro para jovens, mas aqui não vemos fantasia e aventura; vemos a vida real de crianças em situação de rua em uma capital brasileira. 

Vencedor do Concurso Cepe de Literatura Infantil e Juvenil/2010, organizado pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), este é o primeiro livro para jovens de Manoel Constantino, que também é jornalista, ator, diretor e produtor de cinema e de teatro. Já as ilustrações tão realistas foram feitas por Roberto Ploeg, artista plástico holandês que vive no Brasil desde 1979.

A história é narrada em primeira pessoa por Careca, um menino de quatorze anos que fugiu de casa aos nove, cansado do tratamento que o pai destinava à esposa e aos filhos quando chegava bêbado a casa; cansado de apanhar dos pais.

Dói muito ser batido, apanhar de graça, sem poder dar nenhum troco, sem saber o porquê… Só raiva e uma vontade doida de chorar. Eu não chorava porque não podia, ficava engasgado, entupido, entende? (p. 13).

Esse é um ponto importante na trama (e na vida real): conhecendo a motivação de Careca para fugir de casa, pensamos nas crianças, nos jovens e nos adultos em situação semelhante. O que afinal os levou a estar ali? Teria sido essa uma escolha ou a única opção? Qual a história dessas pessoas que encontramos com frequência e de quem não sabemos sequer o nome?

O menino se considera mais corajoso que a mãe, que, mesmo reagindo ao comportamento agressivo do marido, não se separa dele.

A mãe não sei como aguenta. Depois compreendi: ela aguenta por falta de coragem de seguir a vida sozinha, sem o pai. Eu tenho coragem (p. 19).

E tem razão: Careca realmente age com mais coragem que sua mãe — talvez por sua inocência infantil e seu desconhecimento sobre o que encontraria em sua aventura. Resolve deixar para trás a vida de antes e, mesmo se vendo em um mundo que não imaginava existir, sabe que precisa arcar com sua decisão.

Na rua, Careca descobre uma vida diferente, mas não melhor que a anterior. Acabaram-se as surras sem motivo, porém o menino agora tem que tomar conta de si próprio. Não há mais quem cuide dele, aliás, na rua, é cada um por si, cada um tem que se mostrar mais forte que o outro. Na rua, os meninos também dormem amontoados, ficam “com cara de bolo mexido, grudado” (p. 11), como ele e os irmãos.

Careca aprende a se virar: pedindo, inventando histórias para comover os passantes e até roubando. Mas isso só acontece quando conhece a turma do Chupeta, um menino que resolve acompanhar Careca, ensinar a ele suas estratégias de sobrevivência na rua, ser seu anjo da guarda. Apesar das dificuldades, Careca se adapta à nova realidade. Afinal, aquela se torna sua nova vida (e quantas crianças não passaram ou passam por isso ainda, tendo a rua como único lar?).

O livro apresenta um contexto de violência doméstica que culmina na fuga de uma criança; nos leva a refletir sobre nossa cegueira em relação às pessoas em situação de rua (muitas delas crianças); faz referência aos justiceiros (os defensores do “bandido bom é bandido morto”); e choca por não usar meias palavras, mesmo sendo esse um livro para jovens. Não é uma história florida, mas nem por isso deve ser proibida ao público infantil e juvenil. Ao contrário, essa é uma forma de estimular nos jovens a reflexão sobre o mundo ao nosso redor.

Duas mensagens podem ser retiradas da história. A primeira é que, mesmo tendo se tornado o responsável por si mesmo, Careca ainda é um menino, que precisa de apoio, atenção e carinho, como qualquer outro; se encanta com as coisas mais simples; e nem sempre entende de pronto as injustiças. A segunda é que nossa realidade não está dada, não está fixa, como um navio ancorado, mas é mutável e construída no dia a dia, a partir das escolhas que fazemos (ou somos levados a fazer) e das oportunidades que nos são oferecidas.

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2 Comentários

  • ellen
    01 agosto, 2018

    Verdadeiro mas triste.

    • Eriane Dantas
      01 agosto, 2018

      Bastante triste mesmo, Ellen. Esse é um daqueles livros que nos obrigam a ver a realidade.

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