Esse menino cheio de expressões, cheio de estilo, veio ao mundo há exatos 24 meses, antes do nascer do sol.
É engraçado. O nosso primeiro encontro foi também a nossa primeira separação. Ele chegou reclamando, mostrando suas vontades. Seu choro ocupou o espaço e foi interrompido assim que nos aproximamos, como se ele quisesse ouvir o que eu tinha a dizer. Eu nada disse. Só senti sua pele na minha, a sensação de ver de perto um rosto que a tecnologia havia nos antecipado. Era a minha primeira vez ali também, numa sala com tanta luz, com tanta gente ao redor, com tanta volta no estômago. Sua chegada mudou a nossa vida, a rotina da casa, fazendo-nos até mudar de casa.
Já se passaram dois anos e, embora pareça que foi ontem, sinto como se o Joaquim estivesse conosco desde sempre. Incorporou-se à família de forma tão natural, que não existiria mais família sem sua presença.
Falei do Joaquim outras vezes aqui, especialmente de como ele e eu compartilhamos o amor pelos livros. Para além disso, ele proporciona a experiência mais mágica que viverei: a oportunidade de presenciar suas descobertas, sua aprendizagem, de influenciá-las também, de ser parte da formação de um sujeito.
E como ele se desenvolve rápido! Maravilhada eu vejo uma criatura que nem saiu das fraldas falando, cantando, dançando, fazendo associações inacreditáveis, recolhendo fragmentos do mundo aqui e ali, recordando coisas de dias ou semanas antes.
É contraditório falar em um lado bom da pandemia. Não há parte positiva numa doença que matou milhões de pessoas no planeta (mais de 300 mil só no Brasil). Só não posso negar que o isolamento social, dela decorrente, me trouxe uma vantagem: o trabalho remoto, que possibilitou estar mais perto do Joaquim e acompanhar cada um de seus saltos de desenvolvimento.
Por outro lado, ele passou o último ano de vida (o que significa metade dela) quase sem sair de casa, sem interagir com outras pessoas além de nós e meus pais. É uma pena! Observo que, ao contrário de mim, ele é sociável e sente falta de desbravar o mundo. Essa barreira, entretanto, não terá sérias consequências em seu futuro — penso eu.
Joaquim é assim: um menino que encanta, que alegra nossas vidas, que nos faz recobrar a esperança. Ao olharmos suas fotos de outros tempos, admira-nos o quanto sua fisionomia mudou. É o mesmo menino e, ao mesmo tempo, não é. Isso nos lembra que a mudança continuará acontecendo e que, quando menos se esperar, ele entrará aqui de bigode (como costumamos brincar). A cada dia, precisará menos de nós. Até lá, tomara que tenhamos feito o suficiente para ajudá-lo a ser tornar um grande homem.
Escutei em algum lugar: “não deseje que seu filho ou sua filha seja feliz”. Faz sentido. É óbvio que são de felicidade os nossos votos para quem amamos, mas de nada vale ser feliz se for a qualquer custo, mesmo em prejuízo da felicidade, dos sonhos, do bem-estar, da saúde do outro (temos visto tantos exemplos de egoísmo nos dias atuais). É essencial então que as crianças aprendam a se dedicar a um objetivo, tendo em mente que as adversidades se imporão e que o seu querer tem um limite: o da ética, do respeito ao direito das demais pessoas.
Dizemos, de brincadeira, que o Joaquim será cantor, dançarino, modelo, agrônomo, cientista, piloto, veterinário etc. — a todo momento mudamos sua futura profissão, a depender de suas inclinações e de seus interesses (atualmente sua maior vontade é andar de trator e de caminhão). O que eu sonho de verdade para ele, porém, a cada vez que o observo, é que seja corajoso, livre, generoso, correto. Ele não poderá fazer tudo o que quiser, mas poderá batalhar por aquilo que considerar importante e justo. Acima de qualquer coisa, torço que guarde um tantinho de sua inocência, de sua sensibilidade, de sua alegria e de sua curiosidade.
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