22 de agosto de 2018

4 Comentários

[Resenha] O retrato de Dorian Gray

Por Oscar Wilde

  • Título Original: The Picture of Dorian Gray
  • Gênero do Livro: Romance
  • Editora: Penguin Classics Companhia das Letras
  • Ano de Publicação: 2012
  • Número de Páginas: 260
Sinopse: Em 1891, quando foi publicado em sua versão final, O retrato de Dorian Gray foi recebido com escândalo, e provocou um intenso debate sobre o papel da arte em relação à moralidade. Alguns anos mais tarde, o livro foi inclusive usado contra o próprio autor em processos judiciais, como evidência de que ele possuía "uma certa tendência" - no caso, a homossexualidade, motivo pelo qual acabou condenado a dois anos de prisão por atentado ao pudor. Mais de cem anos depois, porém, o único romance de Oscar Wilde continua sendo lido e debatido no mundo inteiro, e por questões que vão muito além do moralismo do fim do período vitoriano na Inglaterra, definida por um dos personagens do livro como "a terra natal da hipocrisia". Seu tema central - um personagem que leva uma vida dupla, mantendo uma aparência de virtude enquanto se entrega ao hedonismo mais extremado - tem apelo atemporal e universal, e sua trama se vale de alguns dos traços que notabilizaram a melhor literatura de sua época, como a presença de elementos fantásticos e de grandes reflexões filosóficas, além do senso de humor sagaz e do sarcasmo implacável característicos de Wilde.
Comprar na Amazon

O artista é o criador de coisas belas. Revelar a arte e ocultar o artista é a finalidade da arte (p. 5).

Hoje vamos falar sobre um clássico polêmico (como todo bom clássico), que, mesmo com o passar do tempo, não pode ser considerado ultrapassado. As reflexões que suscita são tão atuais como o eram no momento de sua produção.

Único romance de Oscar Wilde, O retrato de Dorian Gray teve sua primeira edição em livro em 1891, mas já havia sido publicado pela revista britânica Lippincott’s Monthly Magazine, com a supressão de palavras do original. Mesmo com essa censura, o texto foi considerado imoral, e, em resposta, Wilde escreveu um prefácio no qual defende:

Não existe livro moral ou imoral. Livros são bem escritos ou mal escritos. Isso é tudo (p. 5).

Se, por um lado, o romance alçou Wilde ao sucesso, também o colocou no centro de severas críticas e escândalos, sendo usado inclusive como prova de sua inadequação à sociedade (isso porque era homossexual). Wilde viu então sua fama decair ao se apaixonar por Alfred Douglas, perder uma ação por difamação contra o pai deste e ser condenado a dois anos de reclusão por atos de flagrante indecência.

O livro narra a história de Dorian Gray, um jovem tímido, bonito e inconsciente do fascínio que provoca nas outras pessoas até conhecer o Lord Henry Wotton, um aristocrata que defende a vaidade e o gozo da vida com plenitude. Para o Lord, Dorian deveria aproveitar ao máximo sua juventude e tirar vantagem de seus atrativos físicos.

“[…] O objetivo da vida é o autodesenvolvimento. Realizarmos a nossa natureza com perfeição — é para isso que cada um de nós está aqui. Hoje em dia as pessoas têm medo de si mesmas. Esqueceram-se da mais elevada das obrigações, a obrigação que cada um deve a si próprio. Naturalmente, são caridosas. Alimentam os famintos, vestem os mendigos. Porém suas próprias almas morrem de fome e estão nuas […]” (p. 26).

Inicialmente Dorian nega as palavras do Lord, mas logo muda a forma como vê a importância da beleza e da juventude. Apesar de já ter ouvido elogios de Basil Hallward, um pintor encantado por sua aparência, é por influência do Lord que Dorian passa a admirar a própria beleza e a desejar possuí-la eternamente.

Nesse ponto, observa-se a influência (boa ou ruim) que as pessoas ao nosso redor exercem em nossas vidas, o poder de suas palavras sobre nós e nossa personalidade. “Palavras! Simples palavras! Como eram claras, vívidas e cruéis! Não era possível fugir delas. E no entanto que magia sutil havia nelas!” (p. 28). Ao escutar as ideias do Lord (ditas de modo tão convincente), Dorian começa a construir uma nova autoimagem e uma nova personalidade. Então, apegado à beleza e à juventude, Dorian faz o infame pedido de trocar de papel com seu retrato pintado por Basil.

“Como é triste!”, murmurou Dorian Gray, com os olhos ainda fixos no próprio retrato. “Como é triste” Eu vou ficar velho e horrendo e medonho. Ele jamais envelhecerá além deste dia de junho… Se pudesse ser diferente! Se eu permanecesse sempre jovem e o retrato envelhecesse! Por isso — por isso — eu daria tudo! Sim, não há nada em todo o mundo que eu não daria! Daria a minha alma por isso!” (p. 35).

E seu desejo se concretiza. No primeiro instante, ao ver que seus pecados recaem sobre o retrato e não sobre si mesmo, Dorian se envergonha e esconde o quadro. Com o tempo, porém, passa a considerar conveniente não sofrer com as marcas de suas faltas ou do tempo.

A todo momento, mesmo que seja atingido por um conflito ou certa culpa por seus erros, Dorian é confortado pela ideia de não ter suas perversidades castigadas ou, às vezes, descobertas. Embora cometa os piores atos e cause a ruína de homens e mulheres, Dorian permanece intacto atrás da imagem jovem, bela e pura enquanto seu retrato se deteriora.

Essa é uma alusão à nossa capacidade de agir sem refletir sobre as consequências de nossas atitudes na vida dos outros quando sabemos que não haverá consequências na nossa própria vida (se ninguém descobrirá e eu não serei punido, que mal haverá?).

O livro também leva à reflexão sobre a importância da beleza e da juventude na sociedade atual, podendo alguém como Dorian Gray alcançar seus desejos apenas com esses dois atributos, inclusive mudar (negativamente) a vida de outros e sair ileso de qualquer erro, pois mesmo os que desconfiam de Dorian e não aceitam estar em sua presença não o encaram e fazem vista grossa a seus atos.

Brilhante, a obra revela com fidelidade a essência humana. Somente dois pontos, entretanto, incomodam no texto. O primeiro são os longos diálogos que não fazem sentido para mim (mas podem ser justificados pela época em que foram escritos e por serem realizados por membros da aristocracia britânica). O segundo é a exaustiva descrição dos prazeres de Dorian Gray, que, em certos trechos, pareceram mais enfadonhos do que prazerosos (como colecionar pedras preciosas).

Por outro lado, chama a atenção a descrição da beleza do protagonista, que permite confiar que Dorian é tão deslumbrante como o narrador afirma — o que nem todo texto consegue fazer, pois não é simples descrever pessoas e suas qualidades, caindo-se, muitas vezes, na superficialidade ou no exagero.

confira esses posts relacionados

Deixe seu comentário

4 Comentários

  • ellen
    12 setembro, 2018

    Muito interessante essa obra.
    Aqui, sempre encontro novidades e cultura contemporânea.

    Continue.

    • Eriane Dantas
      17 setembro, 2018

      Obrigada pelo apoio, Ellen! 😉

  • Eliete
    22 agosto, 2018

    Eita! Esse é top demais ♥ sem palavras para expressar a felicidade de ler essa resenha. Simplesmente maravilhosa 💕

    • Eriane Dantas
      27 agosto, 2018

      Esse livro é um arraso mesmo. Não é à toa que continua fazendo sucesso, mesmo depois de tanto tempo.

  • © 2024 Histórias em MimDesenvolvido com por